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Se sobreviverdes a esta época, não vos esqueçais! Não vos esqueçais nem dos bons nem dos maus. Juntai com paciência as testemunhas daqueles que tombaram por eles e por vós.
 

Um belo dia hoje será passado, e falarão numa grande época e nos heróis anônimos que criaram a História.
 

Gostaria que todo mundo soubesse que não há heróis anônimos. Eles eram pessoas e tinham nomes, tinham rostos, desejos e esperanças e a dor do último de entre os últimos não era menor do que a dor do primeiro, cujo nome há de ficar. Queria que todos esses vos fossem tão próximos como pessoas que tivessem conhecido como membros de vossa família, como vós mesmos.

                                                                                                                                                                                                                                                                     
 Julio Fuchik

                                                                                                                                                                              (Testemunho Sob a Forca. São Paulo: Ed. Brasil Debates, 1980)


 

Em Elxs estão aqui, os rostos de brasileiros perseguidos pelo regime militar, oficialmente considerados desaparecidos, fazem-se presentes mediante um processo que combina o desenho de observação e a imaginação. Tomando como base fotografias antigas dessas vítimas ausentes da ditadura civil-militar brasileira, o paulistano Thiago Navas elabora retratos “envelhecidos” dessas pessoas, procurando imaginá-las como seriam hoje. Ao invés de retratá-las a partir das imagens que delas restaram, a partir de sua memória, o artista opta por imaginá-las tais como estariam décadas depois, trazendo-as ao presente. Ao aplicar sobre seus rostos as marcas da passagem do tempo, permite-se imaginar o futuro que não tiveram e, paralelamente, uma realidade alternativa para o país, em que tantas vidas não tivessem sido tolhidas – ou lançadas à escuridão – injusta e precocemente. Com essa operação singela, mas de grande força, a obra restitui corpos àqueles tornados incorpóreos, visibilidade àqueles tornados invisíveis.

Por meio desse trabalho, Navas restitui o futuro negado a tantos perseguidos do regime militar – e ao próprio país. Os olhares penetrantes de cada um dos retratados dirigem-se ao espectador com gravidade, incitando-o a não os esquecer e a não esquecer o seu destino, sua luta, sua dor. Contemplar de uma só vez essas dezenas de rostos – e ser também contemplado por eles – é uma experiência que nos coloca literalmente cara a cara com a dimensão humana da tragédia política. Em cada rosto, buscamos respostas para o mistério de vidas que não foram vividas, encontramos traços de todas as experiências negadas àquelas pessoas, assim como foi negado aos seus amigos e familiares a possibilidade de convívio com elas. Agora, emergem das trevas em que foram lançadas para nos convidar à reflexão sobre nossa história, nosso presente e nosso futuro.


Marcos Kurtinaitis

-english-

The faces of Brazilians persecuted by the military regime, officially considered missing, are made present through a process that combines the drawing of observation and the imagination. Based on old photographs of these victims absent from the Brazilian civil-military dictatorship, the artist produces "aged" portraits of these people, trying to imagine them as they would today. Instead of portraying them exactly as in the images that remained of them, from their memory, we chose to imagine them as they would be decades later, bringing them into the present. By applying to their faces the marks of the passage of time, one can imagine the future they did not have and, in parallel, an alternative reality for the country, where so many lives had not been hindered - or thrown into darkness - unfairly and early. With this simple operation, but of great force, the work restores bodies to those incorporeal tornadoes, visibility to those made invisible.

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